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sábado, outubro 29, 2016

Nietzsche - Loucura e Sabedoria.


_Friedrich Nietzsche em sua obra Ecce Homo, intitula seus capítulos do seguinte modo : "Por que sou tão finalista?", "Por que sou tão sábio?", "Por que sou tão inteligente?", "Por que escrevo livros tão bons?". Tal conduta levou muitos a considerarem sua obra como fora do norrmal e desqualificada por sua loucura. Esse conceito, contudo, revela um superficial juízo do seu pensamento. Para entendê-lo é indispensável colocar-se dentro do próprio âmago de sua concepção filosófica: Nietzsche inverteu o sentido tradicional da filosofia, fazendo dela um discurso ao nível da patologia e considerando a doença "um ponto de vista" sobre a saúde e vice-versa. Para ele, nem a saúde, nem a doença são entidades; a fisiologia e a patologia são uma única coisa; as oposições entre bem e mal, verdadeiro e falso, doença e saúde são apenas jogos de superfície. Há uma continuidade, diz Nietzsche, entre a doença e a saúde e a diferença entre as duas é apenas de grau, sendo a doença um desvio interior à própria vida; assim, não há fato patológico. Friedrich Nietzsche.
A loucura não passa de uma máscara que esconde alguma coisa, esconde um saber fatal e: "demasiado certo". A técnica utilizada pelas classes sacerdotais para a cura da loucura é a "meditação ascética", que consiste em enfraquecer os instintos e expulsar as paixões; com isso, a vontade de potência, a sensualidade e o livre florescimento do eu são considerados "manifestações diabólicas". Mas, para Nietzsche, aniquilar as paixões é uma "triste loucura", cuja decifração cabe à filosofia, pois é a loucura que torna mais plano o caminho para as ideias novas, rompendo os costumes e as superstições veneradas e constituindo uma verdadeira subversão dos valores. Para Nietzsche, os homens do passado estiveram mais próximos da ideia de que onde existe loucura há um grão de gênio e de sabedoria, alguma coisa de divino: "Pela loucura os maiores feitos foram espalhados foram espalhados pela Grécia". Em suma, aos "filósofos além de bem e mal", aos emissários dos novos valores e da nova moral não resta outro recurso, diz Nietzsche, a não ser o de proclamar as novas leis e quebrar o jugo da moralidade, sob o travestimento da loucura. É dentro dessa perspectiva, portanto, que se deve compreender a presença da loucura na obra de Nietzsche. Sua crise final apenas marcou o momento em que a "doença" saiu de sua obra e interrompeu seu prosseguimento. As últimas cartas de Nietzsche são o testemunho desse momento extremo e, como tal, pertencem ao conjunto de sua obra e de seu pensamento. A filosofia foi, para ele, a arte de deslocar as perspectivas, da saúde à doença, e a loucura deveria cumprir a tarefa de fazer a crítica escondida da decadência dos valores e aniquilamento: "Na verdade, a doença pode ser útil a um homem ou a uma tarefa, ainda que para outros signifique doença... Não fui um doente nem mesmo por ocasião da maior enfermidade".

quarta-feira, outubro 12, 2016

NOS BRAÇOS DE MORFEU

Morfeu na mitologia grega  é um deus alado dos sonhos noturnos –  filho de Hipnos (o Sono) e de Nix, a deusa da Noite. Se seu nome significa “forma” (morfo), e alterar-se num elemento de composição de palavras como “morfologia”, é porque ele detém o poder de tomar-se  na aparência humana, para se revelar aos mortais adormecidos.
O poeta Ovídio
43 a.C.,  Em Metamorfoses, escreve que Morfeu é:  “o mais hábil imitador da figura humana”, pois “nenhum outro reproduz com mais arte o modo de andar, a fisionomia, o timbre de voz e até as vestes e os discursos mais familiares de cada pessoa”. Morfeu vai notadamente assumir os traços de Ceix, que pereceu num naufrágio, e aparecer para sua esposa adormecida, Alcíone, para lhe pedir que encontrasse seu corpo e lhe organizasse o funeral. A ilusão é tão perfeita que, quando a esposa acorda, ela exclama: ”Eu o vi, eu o reconheci, eu o toquei (...). Era uma sombra real, a sombra manifesta de meu esposo”. No entanto, se Morfeu traz os sonhos, não é ele originalmente o deus associado ao sono.


O MITO  A expressão vinculada a Morfeu, em verdade, deriva de uma desordem entre os poderes dele e os de seu pai, Hipnos, que adormece os mortais antes de sua última viagem. Na Antiguidade, o falecimento era simbolizado pelo rapto: dois irmãos alados, Hipnos e Tânatos (a Morte), erguem os defuntos nos braços para levá-los ao mundo subterrâneo.


Na contemporaneidade , Morfeu é  vinculado  à papoula, uma planta com faculdades  soníferas. Na arte , ele é retratado volitando, preenchendo a terra de pétalas de papoula para entorpecer os mortais a mando dos deuses. Entretanto, na mitologia, veremos que “cair em seus braços” não é apenas adormecer: é imergir profundamente em outro mundo para se oferecer ao deus das quimeras noturnas e dos sonhos proféticos, pois, com uma batida de asas, Morfeu dá “forma” aos sonhos dos mortais. O vocábulo “morfina” vem também daí. Esse alcaloide de ópio é extraído da papoula, suaviza a dor e possui efeitos alucinógenos. Como se Morfeu escolhesse novo modo de manifestar-se aos seres Humanos.

quinta-feira, julho 21, 2016

Nietzsche Por Ele Mesmo ...


Embora tenha morrido em 1900, os pensamentos do filósofo Friedrich Nietzsche se mostram atuais e úteis. Aqui expomos algumas máximas de Nietzsche. Raramente erramos, se atribuirmos os atos extremos à vaidade, os médicos ao hábito, e os pequeninos ao temor. — Nietzsche De que serve um livro que não saiba levar-nos para além de todos os livros? — Nietzsche Vede, vede… êle foge dos homens… mas os homens seguem-no, porque êle corre à frente… tal como animais de rebanho! — Nietzsche Estado chama-se o mais frio de todos os monstros frios. Mente friamente, e eis aqui a mais mesquinha mentira que sai de sua boca: “Eu, o Estado, sou o Povo”. Mentira! Os que criaram os povos e suspenderam sobre eles uma fé e um amor, eram criadores: serviram à vida. Os que estendem laços ao maior número e a isso chamam Estado, destruidores: suspendem sobre eles uma espada e cem apetites. — Nietzsche Ali onde acaba o Estado, só ali começa o homem que não é supérfluo; ali começa o canto da necessidade, a melodia única, a nenhuma outra semelhança. Ali onde acaba o Estado… olhai, irmãos! Não vedes o arco-íris e a ponte do Super-homem? — Nietzsche Por longo tempo se ocultou na mulher um escravo e um tirano. É por isso que, ainda hoje, ela é incapaz de amizade e só conhece o amor. — Nietzsche O melhor amigo terá também, provavelmente, a melhor esposa, porque o bom matrimônio repousa no talento da amizade. — Nietzsche Enquanto em todos os homens produtivos o instinto é uma força afirmativa e criadora e a consciência uma força crítica e negativa, em Sócrates, o instinto torna-se crítico, e a consciência, criadora. — Nietzsche, A Origem da tragédia no espírito da música — Nietzsche, Vontade de Potência Paulo quer desvalorizar a sabedoria deste mundo: seus inimigos são os bons filólogos e médicos da escola alexandrina – a guerra é feita contra eles. De fato, nenhum homem pode ser filólogo e médico sem ao mesmo tempo ser anticristo. O filólogo vê por detrás dos livros sagrados, o médico vê por detrás da degeneração fisiológica do cristão típico. O médico diz incurável; o filólogo diz fraude… — Nietzsche, O Anticristo A coragem mata também a vertigem à beira de abismos! E onde estará o homem senão à beira de abismos? Mesmo olhar, não será olhar abismos? (…) Mas a coragem, a coragem que ataca é o melhor dos matadores, mata a própria morte pois diz: “ISTO é a vida? Pois então, outra vez! — Nietzsche, Assim Falou Zaratustra A mesma palavra amor significa com efeito duas coisas diferentes para o homem e para a mulher. O que a mulher entende por amor é bastante claro: não é apenas dedicação, é dom total de corpo e alma, sem restrição, sem nenhuma atenção para o que quer que seja. É a ausência de condição que faz de seu amor uma profissão de fé, a única que ela tem. — Nietzsche, A Gaia Ciência Entre minhas obras ocupa o meu Zaratustra um lugar à parte. Com ele fiz à humanidade o maior presente que até agora lhe foi feito. Esse livro, com uma voz de atravessar milênios, é não apenas o livro mais elevado que existe, autêntico livro do ar das alturas […] é também o mais profundo, o nascido da mais oculta riqueza da verdade, poço inesgotável onde balde nenhum desce sem que volte repleto de ouro e bondade — Nietzsche, Ecce Homo O local amaldiçoado onde o cristianismo chocou seus ovos de basilisco deve ser demolido e transformado no lugar mais infame da Terra, constituirá motivo de pavor para a posteridade. Lá devem ser criadas cobras venenosas. — Nietzsche, O Anticristo O que alguém é começa a se revelar quando o seu talento declina – quando ele cessa de mostrar o quanto pode. O talento é também um ornamento; um ornamento é também um esconderijo. — Nietzsche O homem só muito lentamente descobre como o mundo é infinitamente complicado. Primeiramente ele o imagina totalmente simples, tão superficial quanto ele próprio. — Nietzsche, O livro do filósofo O que é grande no homem, é que ele é uma ponte e não um fim: o que pode ser amado no homem, é que ele é umpassar e um sucumbir. — Nietzsche, Assim Falou Zaratustra O que é a verdade, portanto? Um batalhão móvel de metáforas, metonímias, antropomorfismos, enfim, uma soma de relações humanas, que foram enfatizadas poética e retoricamente, transpostas, enfeitadas, e que, após longo usom parecem a um povo sólidas, canônicas e obrigatórias. — Nietzsche, Sobre Verdade e Mentira num Sentido Extra-Moral Vós olhais para cima, quando ansiais por elevação. E eu olho para baixo porque estou elevado. Quem é, entre vós, aquele que pode ao mesmo tempo rir-se e estar nas alturas? Quem sobe às mais altas montanhas ri-se de todas as tristezas, lúdicas e graves. — Nietzsche, Assim Falou Zaratustra Superai-me, ó homens superiores, as pequenas virtudes, as mesquinhas prudências, os escrúpulos ínfimos como grãos de areia, a agitação própria de formigas, o contentamento deplorável, a felicidade da maioria! E mais vale desesperardes do que render-vos. E, em verdade, gosto de vós, porque não sabeis viver nos dias de hoje, ó homens superiores. É por isso mesmo que viveis…da melhor maneira! — Nietzsche, Assim Falou Zaratustra Quem combate monstruosidades deve cuidar para que não se torne um monstro. E se você olhar longamente para um abismo, o abismo também olha para dentro de você. — Nietzsche, Para além do bem e do mal Ouve-se sempre nos escritos de um ermitão algo também do eco do ermo. — Nietzsche, Para além do bem e do mal Uma crítica da faculdade do conhecimento não tem sentido: como poderia uma ferramenta criticar a si mesma quando só pode usar a si mesma para a crítica? O homem bom também quer ser verdadeiro e crê na verdade de todas as coisas. Não só da sociedade, mas também do mundo… De fato, por que razão o mundo deveria enganá-lo? — Nietzsche, O livro do filósofo Se são anormais, não têm então nada a ver com o povo? Não é assim: o povo tem necessidade das anomalias, embora não exista por causa delas. — Nietzsche, O livro do filósofo Todo homem possui sua finalidade particular, de modo que mil direções correm, umas ao lado das outras, em linhas curvas e retas; elas se entrecruzam, se favorecem ou se entravam, avançam ou recuam e assumem desse modo, umas com relação às outras, o caráter do acaso, tornando assim impossível, abstração feita das influências dos fenômenos da natureza, a demonstração de uma finalidade decisiva que abrangeria nos acontecimentos a humanidade inteira. — Nietzsche, Da utilidade e do inconveniente da História para a vida O choque, a ação de um átomo sobre o outro, pressupõe também a sensação. Algo de estranho em si não pode agir sobre o outro. — Nietzsche, O livro do filósofo Só se escolhe a dialética quando não se tem mais nenhuma saída. — Nietzsche, O crepúsculo dos ídolos Cada partido compreende o que interessa à própria conservação não permitir que se esgote o partido o novo império, tem mais necessidade de inimigos do que de amigos: só pelo contraste é que ela começa a se sentir necessária, a tornar-se necessária. — Nietzsche, O crepúsculo dos ídolos Os grandes problemas estão na rua — Nietzsche, Aurora Já dei tudo. Nada me resta de tudo quanto tive, exceto tu, esperança! — Nietzsche Se queres elevar-te, exercita a arte de esquecer. — Nietzsche Diante da necessidade, todo idealismo é ilusão. — Nietzsche Diante do pouco prazer que basta à maioria dos homens para acharem a vida agradável, como lhes admiro a modéstia! — Nietzsche Amar e desaparecer: eis coisas que andam juntas desde a eternidade. Querer amar é também estar pronto para morrer. — Nietzsche Os insetos picam, não por maldade, mas por precisarem viver. O mesmo se dá com os críticos: querem o nosso sangue, mas não a nossa dor. — Nietzsche Os livros que agradam a todos cheiram mal; adere-se–Ihes o cheiro da plebe. Onde a plebe come e bebe, e também onde venera, há sempre mau cheiro. — Nietzsche Desejo eu aos que me interessam, o sofrimento, a solidão, a enfermidade, as perseguições, o opróbrio. Desejo que conheçam o profundo menosprezo de si próprios, o tormento da sua desconfiança, a angústia da derrota. E não os lastimo, pois que lhes desejo a coisa única capaz de demonstrar se valem ou não: a resistência. — Nietzsche Necessário se faz, quando tratamos com os homens, recorrer a uma bondosa dissimulação, como se não pudéssemos penetrar os móveis do seu procedimento. — Nietzsche O verme pisado encolhe-se. É a sua astúcia. Diminui, asam, a probabilidade de ser novamente pisado. Na língua da moral, chama-se isto humildade. — Nietzsche Se eu arrancasse os vossos véus, os vossos trapos, as vossas cores e os vossos gestos, de vós todos, restaria apenas c necessário para assustar pássaros. — Nietzsche Quando nos vemos obrigados a mudar de opinião com lespeito a um indivíduo, fazemos com que pague caro o trabalho que nos deu. — Nietzsche Dizes que uma boa causa justifica tudo, inclusive a guerra? Contesto: uma boa guerra é que justifica qualquer causa. — Nietzsche És jovem e desejas filhos e casamento. Mas eu te pergunto : és vencedor de ti próprio, és o soberano dos teus sentidos? Ou fala em ti a necessidade física, o isolamento, a discórdia contigo próprio?

terça-feira, julho 12, 2016

Filosofar é Necessário

-O ensino de filosofia ainda é pouco compreendido nas escolas, isso pelo fato de que o ensino de filosofia ficou ausente por mais de 40 anos quando nas escolas brasileiras foi banida do currículo escolar pelo regime da Ditadura Militar, e substituída por Educação Moral e Cívica. Só em junho de 2008, sob a governabilidade do presidente Luiz Inácio Lula da Silva a filosofia voltou e se tornou matéria obrigatória no Ensino Médio das escolas de todo o país. Conceitos importantes como verdade, beleza, metafísica, liberdade, lógica, ética e política, por exemplo, são trabalhados nas aulas de filosofia. O ensino de filosofia visa estimular a reflexão e o pensamento crítico dos estudantes levando-os a pensar de modo próprio e com autonomia. A filosofia instiga a visão crítica, a leitura, os questionamentos e faz o estudante refletir um pouco mais sobre o próprio ser humano, portanto a mesma deve ser ensinada no ensino médio, pois assim o estudante não terá apenas uma disciplina a mais, terá uma disciplina que lhe beneficiará tanto escolarmente, quanto para a sua vida cotidiana. Acrescendo o fato de que, a filosofia com seu exercício da análise e a crítica tem como finalidade,o desenvolvimento do ser humano em termos de capacidade reflexiva sobre o seu contexto e de sua existência .
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quarta-feira, janeiro 13, 2016

O Filósofo, Desconstrói Para Reconstruir.

Existimos em um mundo abarrotado de pensamentos e de conceitos herdados por outros que são tidos, em grande parte, como legítimos e verdadeiros. Prosseguirmos repetindo o que nos foi ensinado e algumas vezes sem questionar. Porém, os valores e as certezas se transformam de lugar para lugar, ou de uma ocasião histórica para outra situação também histórica e dentro de cada contexto. Todo contexto histórico tem seus Emaranhados conceituais e formas de pensar consideradas como legítimas. A função do filósofo é dissipar estas convicções e abrir novos horizontes pensando em torno de perspectivas novas e originais. O filosofo duvida da verdade e questiona as certezas, além de ser um provocador do pensamento. Ele Conhece a periferia do óbvio e vai além da obviedade, se distancia do senso comum e não tem nas aparências e muito menos nas opiniões o desígnio da verdade e do conhecimento. Não tem respostas pré definidas, ou prontas e nem é dono da verdade. O filósofo quer suscitar sempre uma nova concepção da realidade que o cerca através da ação do pensar. Desconstrói os saberes prontos, quais são tidos como verdadeiros e reconstrói novas formas de olhar e pensar os saberes antigos,propondo um outro novo olhar e pensar. Essa é a função do filosofo, expor pela articulação do pensamento o refletir a existência de um modo diferente. Ter novos horizontes, buscar novas expectativas de vida e compartilhar com outros suas ideias, essa é entre outras a tarefa do filósodo.Copyright André Assis. Todos os direitos registrados e reservados...

quarta-feira, janeiro 06, 2016

A Necessidade da Filosofia


A filosofia não brota por ser útil, mas tão-pouco pela acção irracional de um desejo veemente. É constitutivamente necessária ao intelectual. Porquê? A sua nota radical era buscar o todo como um tal todo, capturar o Universo, caçar o Unicórnio. Mas porquê esse profundo anseio? Por que não nos contentamos com o que, sem filosofar, achamos no mundo, com o que já é e aí está patente diante de nós? Por esta simples razão: tudo o que é e está aí, quanto nos é dado, presente, patente, é por sua essência um mero bocado, pedaço, fragmento, coto. E não podemos vê-lo sem prever e verificar que está a menos a porção que falta. Em todo o ser que é dado, em todo o dado do mundo encontramos a sua essencial linha de fractura, o seu carácter de parte e só parte - vemos a ferida da sua mutilação ontológica, grita-nos a sua dor de amputado, a sua nostalgia do bocado que lhe falta para ser completo, o seu divino descontentamento. Há doze anos, quando eu falava em Buenos Aires, definia o descontentamento «como um amar sem amado e uma como dor que sentimos em membros que não temos». É o achar de menos o que não somos, o reconhecermo-nos incompletos e manetas. Ortega y Gasset, in 'O Que é a Filosofia?'

Para Que Serve a Filosofia?


O leitor ocupado perguntará para que serve a filosofia. Pergunta vergonhosa, que não fazemos à poética, essa outra construção imaginativa de um mundo mal conhecido. Se a poesia nos revela a beleza que os nossos olhos ineducados não vêem, e se a filosofia nos dá os meios de compreender e perdoar, não lhes peçamos mais - isso vale todas as riquezas da Terra. A filosofia não enche a nossa carteira, não nos ergue às dignidades do Estado; é até bastante descuidosa destas coisas. Mas de que vale engordar a carteira, subir a altos postos e permanecer na ignorância ingénua, desapetrechado de espírito, brutal na conduta, instável no carácter, caótico nos desejos e cegamente infeliz? A maturidade é tudo. Talvez que a filosofia nos dê, se lhe formos fiéis, uma sadia unidade de alma. Somos negligentes e contraditórios no nosso pensar; talvez ela possa classificar-nos, dar-nos coerência, libertar-nos da fé e dos desejos contraditórios. Da unidade de espírito pode vir essa unidade de carácter e propósitos que faz a personalidade e dá ordem e dignidade à vida. Filosofia é conhecimento harmónico, criador da vida harmónica; é disciplina que nos leva à serenidade e à liberdade. Saber é poder, mas só a sabedoria é liberdade. Will Durant, in "Filosofia da Vida" Estados Unidos Will Durant- 5 Nov 1885 // 7 Nov 1981 Filósofo/Historiador